A União Europeia (UE) aprovou na última terça-feira (16) a legislação antidesmatamento, um marco histórico global. Países que exportam diversas commodities (óleo de palma, gado, soja, café, cacau, madeira e borracha) para a UE, como o Brasil, agora têm um prazo de 18 meses (até o final de 2024), para provar que cumprem as obrigações de rastreabilidade e due dilligence impostas pela legislação, mostrando evidências de que esses produtos não foram cultivados em terras desmatadas ou degradadas após 31 de dezembro de 2020.
As regras também se aplicam a vários produtos derivados, como chocolate, móveis, papel impresso e derivados selecionados à base de óleo de palma (também conhecido como óleo de dendê).
A adoção desta nova regulação europeia representa um passo relevante para o enfrentamento global do desmatamento, além de sinalizar a atuação pioneira da União Europeia na mobilização de mecanismos de política comercial para promover objetivos climáticos e ambientais. No entanto, existem pontos que ainda precisam ser analisados:
1. Falta de apoio para países cumprirem as normas: apesar de estabelecer o prazo de 18 meses para os países exportadores cumprirem as normas exigidas, a UE não prevê assistência, seja financeira ou técnica, para que essa etapa seja cumprida.
2. Produtores que já desmataram ilegalmente antes poderão exportar: a legislação considera o ano de 2020 como data de corte de desmatamento, o que representa retrocesso em relação aos esforços anteriores de combate ao desmatamento, sobretudo ilegal. Exemplo disso é que a legislação permite que produtores agrícolas que tenham desmatado ilegalmente suas propriedades até a data de corte estipulada encontrem a possibilidade de exportar suas commodities para a UE, mesmo tendo agido contra o Código Florestal Brasileiro, em vigor desde 2012.
3. Desconsidera biomas importantes no combate às mudanças climáticas: a regulação aplica-se apenas ao desmatamento de florestas tropicais, tais como definidas pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), deixando para avaliação futura – neste caso, um ano depois da entrada em vigor da regulação – a inclusão, em seu escopo, de outros biomas também ameaçados pela expansão das fronteiras agrícolas e pelo desmatamento. É o caso do Cerrado brasileiro – bioma responsável por cerca de 15% da soja importada pela UE, e que tem apenas 26% de sua área protegida pela lei proposta. Apesar de os europeus considerarem incluir “other wooded lands” (outras terras florestadas) na lei, a adição desses outros biomas não foi aprovada na versão da regulação recentemente adotada.
4. Não responsabiliza quem financia o desmatamento: outro ponto que ficou para discussão futura é a inclusão na legislação da responsabilização de instituições que financiam o desmatamento. De acordo com estudo do Global Witness, entre 2016 e 2020, bancos europeus lucraram 401 milhões de euros em negócios relacionados a desmatamento.
Para Olivia Zerbini, analista de pesquisa do IPAM, é fundamental que o mercado internacional entenda e reconheça seu papel e responsabilidade no combate ao desmatamento e às mudanças climáticas. «A legislação inicia esse movimento, sendo uma vitória histórica. No entanto, faltou construção coletiva e diálogo com os diversos setores dos países exportadores de commodities desde o início e isso é primordial daqui para frente», declara.
Agora, a legislação entra em vigor e os produtores e as empresas têm até o final de 2024 para se regularizarem. Ao completar um ano da aprovação, a UE deve revisar a medida.
Saiba mais sobre a legislação antidesmatamento da UE aqui.
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