Qual é o melhor caminho para um acordo mais justo entre Mercosul-UE?


IPAM, Sara Pereira em 07/04/2021
Amazônia
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O segundo episódio da série OCAA Webinários, promovido pelo Observatório de Comércio e Ambiente na Amazônia, foi ao ar na quinta-feira, dia 1º de abril. Mediado pela diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes) e membro do OCAA, Sandra Rios, o evento convidou especialistas para debaterem os melhores caminhos a seguir para alcançar um acordo mais sustentável entre Mercosul e União Europeia (UE).

O ponto de partida para a conversa foi o artigo Proposals on the EU-Mercosur Association Agreement and the Environment, cuja elaboração foi coordenada pelo professor – e convidado dessa segunda rodada – da Faculdade de Direito da Universidade de Warwick (Reino Unido), James Harrison, junto a outros autores.

O texto afirma que o capítulo “Comércio e Desenvolvimento Sustentável” (TSD na sigla em inglês) do Acordo de Associação UE-Mercosul (EUMAA, em inglês) não aborda adequadamente as questões de mudança climática e degradação ambiental, tanto na UE quanto nos países do Mercosul. A publicação oferece, entre outros pontos, cinco propostas para tratar de questões ambientais graves e globalmente urgentes.

Penalidade é a solução?

Ao apresentar o estudo publicado pela Universidade de Warwick, Harrison afirmou que a inexistência de qualquer tipo de sanção – dentre outras limitações, como a ausência da determinação de um papel para os órgãos da sociedade civil – pode significar que o capítulo TSD sugerido pelo tratado não seja um mecanismo que traga aplicações plausíveis.

“Essa parte do acordo contém uma série de disposições sobre questões ambientais mais amplas, mas muitas delas são compromissos vagos de cooperação, sem especificação ou detalhes sobre a contribuição formal, bem como seus objetivos, prioridades e intensidade”, explicou o professor.

Em seguida, a professora da Escola de Economia de São Paulo na Fundação Getúlio Vargas (FGV), Vera Thorstensen, apontou que seria problemático utilizar os instrumentos de comércio propostos por Harrison, já que estes não são compatíveis com as regras da Organização Mundial de Comércio (OMC). Segundo ela, diferente do que propõe o estudo, é impossível propor tarifas variáveis pelo cumprimento ou não de regras ambientais, além de ir à contramão das normas estabelecidas pela OMC.

“Usem o EUMAA para pressionar o Brasil a cumprir suas obrigações (…), o acordo é de comércio, não é um acordo multilateral de investimento”, rebateu Vera. “O objetivo é excelente, mas estão usando os instrumentos errados para alcançá-los e que pode, inclusive, provocar o efeito contrário”, completou.

Posteriormente, professor sênior de Agronegócio Global do Insper e coordenador do “Insper Agro Global”, Marcos Jank sugeriu que a Europa avaliasse a melhor forma de lidar com o Brasil, ao invés de aplicar sanções e banimento de produtos nacionais como solução para mitigar os problemas climáticos.

“Há 10 anos, 25% da exportação brasileira ia para a Europa. Hoje, o número caiu para 16%”, apontou. “Quem está comprando os produtos brasileiros são os asiáticos, em volumes cada vez maiores, e eles estão longe de chegar nesse nível de exclusão e banimento. Eles querem monitoramento, mas não retirar o Brasil do cenário, pois terão problemas de segurança alimentar”, exemplificou Jank.

Passado e futuro

Em resposta aos comentários de Thorstensen e Jank, o professor Harrison destacou a necessidade de se observar não apenas os 25 anos que o acordo levou para ser negociado. Para ele, é importante levar em consideração as mudanças que as regras estabelecidas no passado podem sofrer e significar nos próximos 50, 100 anos. “Elas [as regras] serão os alicerces de dois blocos econômicos com 600 milhões de pessoas que vão reger essa relação comercial durante décadas e décadas”, explicou.

Ao final, os convidados tiveram a chance de responder às perguntas e às observações da audiência. Ana Toni, diretora executiva do iCS (Instituto Clima e Sociedade) e membro do OCAA, questionou Harrison se seria aceitável que o acordo fosse assinado antes mesmo de o Brasil cumprir sua própria lei, uma vez que a média do desmatamento da Amazônia em 2020, segundo ela, teria sido em torno de 11 mil km².

O professor explicou que, frequentemente, os acordos comerciais exigem que os países façam cumprir suas próprias leis e ressaltou que os esforços de conservação do Brasil parecem ter regredido em 2020. “Normalmente, os países reforçam os compromissos internacionais uns dos outros, mas nesta situação nós temos um problema. Portanto, acho que voltar-se para os compromissos nacionais que o Brasil assumiu em suas leis é uma das soluções”.

Para acompanhar mais sobre essa discussão, clique aqui e assista ao segundo episódio completo do OCAA Webinários.

Clique aqui e tenha acesso ao primeiro episódio do OCAA Webinários: “O acordo UE-Mercosul & O desmatamento na Amazônia”, com mediação do coordenador de comunicação do Observatório do Clima, Claudio Ângelo. Participaram como convidados o pesquisador sênior do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), Paulo Barreto, e a especialista sênior em análise ambiental da London School of Economics, Stefania Lovo


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